terça-feira, 15 de janeiro de 2008

Fábula.

Era uma vez uma casa de telhados duros e janelas opacas e fechadas. Guardava os fumos numa nuvem negra e brilhante e o papel de parede caía agarrado ao estuque. No chão, abriam-se poças de chuva azeda, infestada de um cheiro desagradável.
Às vezes, enchia-se de corpos de várias formas e feitios, adornados com jeitos e idiossincrasias únicas. Corpos-mutantes, numa mistura entre felinos e humanos, de garras compridas e olhos pequenos. Fundiam-se. Orgias singulares de quem vive sem sons no peito. Banquetes de luxúria abrasiva onde a pele era arrancada sem vestígio de sangue possível. Delícias de um mundo tão grande e reservado, onde só entra quem souber respirar melhor. Um mar de cadáveres, num suor de sombra rente à boca seca de novas palavras.
As divisões transbordavam de ecos vibrantes e o chão era de tapetes estranhos, um veludo invulgar que arranhava como unhas mal limadas.
Um dia ouviu-se um grito e as portas abriram-se de repente. Espalharam-se passos apressados e deixaram um murmúrio para trás. Apenas um murmúrio violento no lugar da cama.
E os dias passaram, com horas a mais no mesmo relógio. E as distâncias, essas, eram longas demais para se medirem.
Cantaram os corvos, ainda ao longe, que haviam de ruir a casa, em pétalas de mil cores e cheiro a citrinos frescos, e que me iriam tatuar sorrisos no canto dos lábios. Um dia. Quem sabe.
15 Janeiro 2008 : 02.34

3 comentários:

Anónimo disse...

pedro não sei o que dizer..depois de lêr o que escreveste não sei se penso com a cabeça ou com o coração...se pensar com a cabeça todas essas palavras podem não passar de devaneios cerebrais de palavras obsuletas sem algum significado fruto de desiquilibrios quimicos designados de psicose, que pode ser desplotada pelo consumo de psicotrópicos e alcool, ou patologia de origem genética...se pensar com o coração essas palavras são verdades cortantes, palavras que entram no nosso corpo e o fazem ficar sem forças como um cadáver frio e pálido, frases e proposições que em alguns momentos parecem retratar certos episódios da minha vida...mas pedrinho acho que a observação mais plausível é conciliar estas duas...pois um escritor, ou pintor, qualquer artista, tem de possuir uma grande dose de talento mas também uma pequena dose de psicose, já assim era gaudi, picasso, fernando pessoa, muitas vezes o talento vem aliado a distúrbios psicológicos, só assim nascem os grandes artístas...Mas para mim és mais do que um artista, porque os artistas normalmente vivem fechados num mundo próprio sem nunca sair dele, e tu sais muitas vezes do teu, e quando o fazes é para me roubares do meu mundo e me proteger de tudo o que nele me magoa...

Anónimo disse...

Não sei o que dizer...
Tu consegues tocar lá mesmo no fundo de qualquer sentimento.
Serás uma especie de poeta, um pensador, um filosofo ou alguma especie de ser por descobrir???
Eu não sei, mas também não interessa.
O que eu sei é que as tuas palavras magoam por serem ditas com sentimentos profundos.
Tu és muito especial para mim e eu gosto de ti assim...

Rui disse...

"Coisa Ruim"

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